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Amor em trânsito: “Nunca mais boto meus pés no Arsenal!”

Amor em trânsito: “Nunca mais boto meus pés no Arsenal!”

No último banco do 43, Bruno mordia os lábios para não chorar. Seu coração não tinha dúvidas quanto ao seu amor por Jaqueline, mas em sua cabeça pesavam as consequências do deslocamento quase diário, por entre tantos quilômetros e conduções fedorentas para encontrar a paz daquele sorriso.

Bruno morava na Trindade. São Gonçalo é enorme, mas a precariedade do transporte público inviabilizava amores à distância. Conhecera Jaqueline em uma peça no SESC, e se apaixonara de cara. Jack era amiga de amigos, e os dois grupos decidiram esticar da peça para o Bar do Blues, e lá sentiu o vento passar por dentro de seu estômago quando seus lábios a tocaram pela primeira vez.

De lá pra cá, três anos, hoje. Não via a hora de terminar a faculdade e começar a trabalhar. Jack se enquadrara de recepcionista em uma clínica assim que terminou a escola e nunca mais saiu. “Vale a pena, vai chegar a hora em que não vou precisar ir embora depois do Fantástico”, ele pensava a cada noite em que saltava no Alcântara deserto para pegar o 409 e voltar pra casa, depois de horas de varanda. Mas não daquela vez.

O celular vibrava em seu bolso. Sabia que era ela, mas não daria o braço a torcer, não aceitaria as desculpas desta vez. Chegara da faculdade, tomara banho correndo e partira para sua viagem. O ABC lotado saindo da Trindade, o Rosana que parecia nunca vir. Saltar na estrada, ziguezaguear as ruas de terra (bom, pelo menos não havia chovido), para não encontrar Jaqueline em casa. Justo naquele dia? “Da próxima vez, namoro alguém do Mutondo, ou Porto Novo.”

Jogou as flores numa lixeira no Alcântara. No 409, ruminava a ideia de como terminar o namoro. Não poderia dizer que era apenas a distância, mas estava muito puto por ter ido mais uma vez à toa pro Arsenal. “Aposto que vai dizer que o consultório fechou tarde”, mas quando finalmente pegou o celular, a bateria tinha acabado.

Desceu do ônibus, passou na padaria e comprou dois litrões. Entrou em casa cabisbaixo, sua mãe na sala assistia ao jornal e ainda chamou seu nome, mas ele não queria papo. Colocou uma garrafa na geladeira e abriu a outra, bebendo um pouco do gargalo antes de pegar o copo no armário, dando desculpa para as lágrimas.

– Você não atende celular não? – a voz de Jaqueline em suas costas quase o fez engasgar. – Quis te fazer uma surpresa, peguei o táxi em Icaraí e vim direto pra cá. Feliz aniversário de namoro.

Quando virou, ela estava linda, com um buquê de flores na mão – parecido até com o que jogara fora no Alcântara.

De repente, a distância entre Trindade e Arsenal se resumiu a apenas um beijo. Mesmo longe muitas vezes, ainda existe amor em São Gonçalo.

Damiana Duarte
Damiana Duartehttp://damianaduarte.blogspot.com.br/
Damiana Duarte é escritora e poetisa. Cresceu e sobrevive do amor que há em São Gonçalo.

No último banco do 43, Bruno mordia os lábios para não chorar. Seu coração não tinha dúvidas quanto ao seu amor por Jaqueline, mas em sua cabeça pesavam as consequências do deslocamento quase diário, por entre tantos quilômetros e conduções fedorentas para encontrar a paz daquele sorriso.

Bruno morava na Trindade. São Gonçalo é enorme, mas a precariedade do transporte público inviabilizava amores à distância. Conhecera Jaqueline em uma peça no SESC, e se apaixonara de cara. Jack era amiga de amigos, e os dois grupos decidiram esticar da peça para o Bar do Blues, e lá sentiu o vento passar por dentro de seu estômago quando seus lábios a tocaram pela primeira vez.

De lá pra cá, três anos, hoje. Não via a hora de terminar a faculdade e começar a trabalhar. Jack se enquadrara de recepcionista em uma clínica assim que terminou a escola e nunca mais saiu. “Vale a pena, vai chegar a hora em que não vou precisar ir embora depois do Fantástico”, ele pensava a cada noite em que saltava no Alcântara deserto para pegar o 409 e voltar pra casa, depois de horas de varanda. Mas não daquela vez.

O celular vibrava em seu bolso. Sabia que era ela, mas não daria o braço a torcer, não aceitaria as desculpas desta vez. Chegara da faculdade, tomara banho correndo e partira para sua viagem. O ABC lotado saindo da Trindade, o Rosana que parecia nunca vir. Saltar na estrada, ziguezaguear as ruas de terra (bom, pelo menos não havia chovido), para não encontrar Jaqueline em casa. Justo naquele dia? “Da próxima vez, namoro alguém do Mutondo, ou Porto Novo.”

Jogou as flores numa lixeira no Alcântara. No 409, ruminava a ideia de como terminar o namoro. Não poderia dizer que era apenas a distância, mas estava muito puto por ter ido mais uma vez à toa pro Arsenal. “Aposto que vai dizer que o consultório fechou tarde”, mas quando finalmente pegou o celular, a bateria tinha acabado.

Desceu do ônibus, passou na padaria e comprou dois litrões. Entrou em casa cabisbaixo, sua mãe na sala assistia ao jornal e ainda chamou seu nome, mas ele não queria papo. Colocou uma garrafa na geladeira e abriu a outra, bebendo um pouco do gargalo antes de pegar o copo no armário, dando desculpa para as lágrimas.

– Você não atende celular não? – a voz de Jaqueline em suas costas quase o fez engasgar. – Quis te fazer uma surpresa, peguei o táxi em Icaraí e vim direto pra cá. Feliz aniversário de namoro.

Quando virou, ela estava linda, com um buquê de flores na mão – parecido até com o que jogara fora no Alcântara.

De repente, a distância entre Trindade e Arsenal se resumiu a apenas um beijo. Mesmo longe muitas vezes, ainda existe amor em São Gonçalo.

Damiana Duarte
Damiana Duartehttp://damianaduarte.blogspot.com.br/
Damiana Duarte é escritora e poetisa. Cresceu e sobrevive do amor que há em São Gonçalo.

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