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Viradouro, Porto da Pedra e a representatividade das escolas de samba

Sem rivalidade: o melhor é São Gonçalo abraçar Viradouro e Porto da Pedra como marcas da cidade, assim como muitos já fazem há anos.

Viradouro, Porto da Pedra e a representatividade das escolas de samba

Sem rivalidade: o melhor é São Gonçalo abraçar Viradouro e Porto da Pedra como marcas da cidade, assim como muitos já fazem há anos.

Em fevereiro de 2018, a Viradouro sagrou-se campeã do grupo de acesso das escolas de samba do Rio de Janeiro. Com essa vitória, conseguiu seu retorno ao grupo Especial. Na mesma competição, a Unidos do Porto da Pedra ficou em 3º lugar. E no próximo ano, tentará novamente uma vaga na elite.

Para conhecer a histórias das duas escolas, clique a seguir em:

A intenção aqui é falar sobre a representatividade das escolas de samba locais no carnaval. Isso envolve, inclusive, o bairrismo recente que tenta opor as duas agremiações que representam a cidade no carnaval carioca. Os argumentos são passionais, fáceis de acreditar, especialmente se você for um “gonçalense novo”, ou seja, começou a pouco tempo a ter uma identificação com a cidade.

Desfile da Porto da Pedra em 2018, no grupo de acesso.
Rainha de bateria Danielle Ferreira no desfile da Porto da Pedra em 2018, no grupo de acesso. Foto: O Carnavalesco / Allan Duffes e Magaiver Fernandes

Já de antemão, agradeço a André Churros, fundador do São Bloco e mestrando em Estudos Literários pela UERJ/FFP, pela consultoria.

Uma escola de samba entre cidades irmãs

A Viradouro é uma das raras escolas de samba que se divide em 2 cidades: São Gonçalo e Niterói. Desde o samba de 1994, “Tereza De Benguela – Uma Rainha Negra No Pantanal”, já era possível ouvir o intérprete, Rico Medeiros, anunciando as duas cidades no início do samba-enredo, em seu grito de guerra.

Mas foi na voz de ouro de Dominguinhos do Estácio que o clássico “Alô, Niterói. Alô, São Gonçalo. Olha a Viradouro Chegando” tornou-se uma marca inconfundível, selando o vínculo definitivo da escola entre as duas cidades.

A estratégia acertada da Viradouro em conclamar ambos os municípios no início dos sambas já mostrava a percepção do crescimento da Porto da Pedra. Em 1994, a Porto já desfilava entre as escolas cariocas, com o objetivo de chegar ao sonhado Grupo Especial.

No Bonde do Samba: Unidos do Viradouro
O bonde que fazia o retorno no “Viradouro” em Santa Rosa, Niterói.

Mesmo com seu início no “Viradouro dos Bondes” (em Santa Rosa), foi no Barreto – bairro que fica na divisa entre as duas cidades – que a escola fez sua história mais recente. O fácil acesso a ambos os municípios fez com que seus cidadãos participassem das atividades da escola, ajudando-a, inclusive, no caminho vitorioso das décadas anteriores.

Ensaios da Viradouro em São Gonçalo

Para os gonçalenses novos, que não presenciaram os anos 90 e a primeira metade dos anos 2000, é interessante lembrar que a Viradouro fazia seu primeiro ensaio preparativo para o carnaval no trecho entre o Paraíso e a Mangueira.

Quadra da Viradouro no Barreto em 2014, quando a escola conseguiu retornar ao grupo especial. Foto: Márcio Oliveira
Quadra da Viradouro no Barreto em 2014, quando a escola conseguiu retornar ao grupo especial. Foto: Márcio Oliveira

Os ensaios de rua sempre foram um dos melhores captadores de novos fãs para as escolas. A Viradouro, em especial, fazia seus ensaios ao final das tardes, o que levava muitas famílias às ruas. Ainda criança, eu ia com minha avó. Situação bem diferente de hoje, em que os ensaios da Porto da Pedra são à noite e não têm o mesmo perfil familiar, notando-se a pouca participação de crianças, infelizmente.

Ainda me recordo do ensaio de 2001. Foi um ensaio de rua marcante, especialmente pela presença da Luma de Oliveira, modelo de sucesso da época, à frente da bateria do Mestre Ciça. A rua estava lotada num nível difícil de mensurar.

Os ensaios na cidade acabaram ainda nos anos 2000, quando a escola limitou-se a ensaiar na Avenida Ernani do Amaral Peixoto, no Centro de Niterói. Um dos prováveis motivos foi a falta de apoio dos governos locais na logística do fechamento das ruas.

Há também quem diga que o horário dos desfiles no Paraíso/Patronato interferia no andamento da missa da Igreja Nossa Senhora Aparecida, que ocorria no mesmo horário. Quem participou da escola na época, diz que ao passar pela igreja, o carro de som e a bateria precisavam parar suas atividades, retomando-as mais à frente.

A Porto da Pedra contornou esses problemas jogando seus ensaios para mais à noite.

Portal da Loucura da Porto da Pedra em 1997, no samba que conquistou o quinto lugar no grupo especial
Portal da Loucura da Porto da Pedra em 1997, no samba que conquistou o quinto lugar no grupo especial, retornando no sábado das campeãs.

Uma era vitoriosa de Viradouro e Porto da Pedra

O ano de 1997 foi um marco para Porto da Pedra. Em seu segundo ano como desfilante na Sapucaí, a escola conseguiu um memorável 5º lugar, voltando entre as campeãs no sábado seguinte.

Maior ainda foi a emoção da Viradouro, quando, com o enredo “Trevas! Luz! Explosão do Universo”, de Joãozinho Trinta, sagrou-se campeã daquele ano.

Naquele ano, após o fim da apuração das notas, era impossível sair, entrar ou transitar em São Gonçalo. No Barreto, principal entrada do município, a Viradouro comemorava o título inédito e, no Centro da cidade, a Porto da Pedra comemorava a colocação inédita. Hoje sabemos que este foi o máximo de representatividade que o leste fluminense pôde alcançar no quesito Carnaval.

O marco foi ainda mais intenso, pois as duas escolas que a representavam no Grupo Especial desfilaram no domingo pós-carnaval, no Rodo.

Integração entre as escolas do leste fluminense

Mesmo com o sucesso e a proximidade geográfica de ambas, parece que não havia um esforço para que elas se integrassem. Entre os componentes, a regra não dita era: “quando se desfila em uma, não se desfila na outra”.

E um grupo se destaca nesse ponto: a bateria.

Surdo de Primeira da Bateria Ritmo Feroz, da Unidos do Porto da Pedra.
Bateria Ritmo Feroz, da Unidos do Porto da Pedra. Fotografia: Jaylton Pimentel

Um dos promotores desses primeiros passos em direção à integração das baterias foi o Mestre Marcinho. Cria da Viradouro, Marcinho tornou-se um mestre de bateria de sucesso na escola Em Cima da Hora. Por ter se destacado, foi convidado a reger a Ritmo Feroz, a bateria da Porto da Pedra. Por seu histórico, conseguiu atrair alguns de seus parceiros para desfilar pela Porto.

“Eu me lembro do primeiro ensaio do Marcinho como Mestre da Porto da Pedra. Substituía o Mestre Cosme, que já estava na escola desde a ascensão ao grupo especial. Marcinho era um dos diretores auxiliares do Mestre Ciça na Viradouro e isso fez com que muitos de nós fôssemos ajudá-lo no novo trabalho. Na primeira reunião, ficou nítida a hostilidade de ambos os lados: de um lado, a galera da Porto; de outro, a gente da Viradouro, os forasteiros. Foi um começo complicado, mas, ao longo do tempo, o Marcinho conseguiu fazer um intercâmbio entre as baterias”, diz André Churros.

Aos poucos, quando os horários de desfile não interferiam, membros das duas escolas passaram a se frequentar mais, apesar de alguns relatos mencionarem que a Viradouro nem sempre recebesse membros da Porto tão bem.

Joãosinho Trinta na Sapucaí pela Viradouro em 1994
Joãosinho Trinta na Sapucaí pela Viradouro, ainda em 1994, com o enredo “Tereza De Benguela – Uma Rainha Negra No Pantanal”. Foto: Arquivo O Globo / Ivo Gonzalez

Retorno de mídia de Viradouro e Porto da Pedra

Apesar de termos poucos indicadores palpáveis sobre isso nas décadas passadas, é ponto pacífico que ainda há muita lembrança de ambas as marcas, quando o assunto é Niterói e São Gonçalo no grupo especial.

E nesse quesito, a Viradouro pode contribuir mais com sua história campeã.

De 1997 a 2007, a escola do Barreto voltou no Sábado das Campeãs por 9 vezes. Enquanto isso, a Porto da Pedra, que só voltou em 1997, trabalhava para fazer um bom desfile e se manter na categoria.

Joãosinho Trinta recebe Caetano Veloso na quadra da Viradouro, no Barreto em 1998. Foto: Carlos Ivan
Joãosinho Trinta recebe Caetano Veloso na quadra da Viradouro, no Barreto em 1998. Ao fundo, Tony Garrido, Cidade Negra. Foto: Carlos Ivan

Essa diferença marcou a Viradouro como uma escola de ponta, que disputa campeonato e tem cara de campeã. Isso, somado à equipe técnica da escola – que já teve em seu plantel nomes como os lendários Joãozinho Trinta, Mestre Ciça, Dominguinhos do Estácio, além das rainhas de bateria Luma de Oliveira e Juliana Paes em seus auges –, deram ainda mais credibilidade à bandeira da agremiação de São Gonçalo e Niterói.

Não se pode esquecer que, nos carnavais de 1997 e 1998, a Viradouro apresentou os 2 sambas que tiveram uma aceitação popular inimaginável naqueles carnavais e são cantados até hoje: “Vou cair na gandaia/Com a minha bateria/No balanço da mulata/A explosão de alegria” (1997) e “Hoje o amor está no ar/Vai conquistar seu coração/”Tristeza não tem fim, felicidade sim”/Sou Viradouro, sou paixão” (1998).

Acrescente-se a esses sambas o fato de a Unidos do Viradouro, em 1998, ter apresentado o enredo Orfeu, o Negro do Carnaval, baseado no mito grego e na peça de Vinicius de Moraes, que virou filme lançado em 1999, dirigido por Cacá Diegues. Todas as filmagens diretamente ligadas ao carnaval foram feitas na quadra, no barracão e no desfile da escola.

A Viradouro, então, era agora frequentada por personalidades como Caetano Veloso, Cacá Diegues, Toni Garrido, Patrícia França, Murilo Benício, Milton Gonçalves, Zezé Motta, Stepan Nercessian, entre outros. Todos queriam estar e desfilar na escola que, na época, era a escolhida dos atores e demais celebridades.

“Era realmente algo muito fora de comum. De uma hora outra para outra, todas as celebridades que eu via na TV estavam lá na quadra, em todos os ensaios e eventos. Quadra com lotação máxima sempre. Só fui ver tantas celebridades reunidas dentro de uma só escola de samba quando desfilei na Grande Rio em 2010”, diz André Churros.

Pensando nesse histórico, ainda vivo na cabeça de muitos gonçalenses, é um desperdício de energia nutrir qualquer tipo de rivalidade entre Viradouro e Porto da Pedra. Suas trajetórias são distintas, bem como a lembrança de marca que cada uma gerou ao longo do tempo.

Nesse sentido, o mais correto seria São Gonçalo voltar a abraçar ambas como marcas da cidade. Bem como muitos gonçalenses já fazem há anos.

Porém, tudo na vida envolve um fator fundamental para que tudo aconteça: o dinheiro. E é sobre ele que falaremos num post futuro. Abordando o relacionamento entre prefeituras, mídia, empresários e o jogo do bicho.

Matheus Graciano
Matheus Gracianohttps://www.matheusgraciano.com.br
Matheus Graciano é o criador do SIM São Gonçalo, onde fez o meio de campo da revista eletrônica de 2012 a 2020. É designer que programa, escreve e planeja. Trabalha na Caffifa Agência e Consultoria Digital.

Em fevereiro de 2018, a Viradouro sagrou-se campeã do grupo de acesso das escolas de samba do Rio de Janeiro. Com essa vitória, conseguiu seu retorno ao grupo Especial. Na mesma competição, a Unidos do Porto da Pedra ficou em 3º lugar. E no próximo ano, tentará novamente uma vaga na elite.

Para conhecer a histórias das duas escolas, clique a seguir em:

A intenção aqui é falar sobre a representatividade das escolas de samba locais no carnaval. Isso envolve, inclusive, o bairrismo recente que tenta opor as duas agremiações que representam a cidade no carnaval carioca. Os argumentos são passionais, fáceis de acreditar, especialmente se você for um “gonçalense novo”, ou seja, começou a pouco tempo a ter uma identificação com a cidade.

Desfile da Porto da Pedra em 2018, no grupo de acesso.
Rainha de bateria Danielle Ferreira no desfile da Porto da Pedra em 2018, no grupo de acesso. Foto: O Carnavalesco / Allan Duffes e Magaiver Fernandes

Já de antemão, agradeço a André Churros, fundador do São Bloco e mestrando em Estudos Literários pela UERJ/FFP, pela consultoria.

Uma escola de samba entre cidades irmãs

A Viradouro é uma das raras escolas de samba que se divide em 2 cidades: São Gonçalo e Niterói. Desde o samba de 1994, “Tereza De Benguela – Uma Rainha Negra No Pantanal”, já era possível ouvir o intérprete, Rico Medeiros, anunciando as duas cidades no início do samba-enredo, em seu grito de guerra.

Mas foi na voz de ouro de Dominguinhos do Estácio que o clássico “Alô, Niterói. Alô, São Gonçalo. Olha a Viradouro Chegando” tornou-se uma marca inconfundível, selando o vínculo definitivo da escola entre as duas cidades.

A estratégia acertada da Viradouro em conclamar ambos os municípios no início dos sambas já mostrava a percepção do crescimento da Porto da Pedra. Em 1994, a Porto já desfilava entre as escolas cariocas, com o objetivo de chegar ao sonhado Grupo Especial.

No Bonde do Samba: Unidos do Viradouro
O bonde que fazia o retorno no “Viradouro” em Santa Rosa, Niterói.

Mesmo com seu início no “Viradouro dos Bondes” (em Santa Rosa), foi no Barreto – bairro que fica na divisa entre as duas cidades – que a escola fez sua história mais recente. O fácil acesso a ambos os municípios fez com que seus cidadãos participassem das atividades da escola, ajudando-a, inclusive, no caminho vitorioso das décadas anteriores.

Ensaios da Viradouro em São Gonçalo

Para os gonçalenses novos, que não presenciaram os anos 90 e a primeira metade dos anos 2000, é interessante lembrar que a Viradouro fazia seu primeiro ensaio preparativo para o carnaval no trecho entre o Paraíso e a Mangueira.

Quadra da Viradouro no Barreto em 2014, quando a escola conseguiu retornar ao grupo especial. Foto: Márcio Oliveira
Quadra da Viradouro no Barreto em 2014, quando a escola conseguiu retornar ao grupo especial. Foto: Márcio Oliveira

Os ensaios de rua sempre foram um dos melhores captadores de novos fãs para as escolas. A Viradouro, em especial, fazia seus ensaios ao final das tardes, o que levava muitas famílias às ruas. Ainda criança, eu ia com minha avó. Situação bem diferente de hoje, em que os ensaios da Porto da Pedra são à noite e não têm o mesmo perfil familiar, notando-se a pouca participação de crianças, infelizmente.

Ainda me recordo do ensaio de 2001. Foi um ensaio de rua marcante, especialmente pela presença da Luma de Oliveira, modelo de sucesso da época, à frente da bateria do Mestre Ciça. A rua estava lotada num nível difícil de mensurar.

Os ensaios na cidade acabaram ainda nos anos 2000, quando a escola limitou-se a ensaiar na Avenida Ernani do Amaral Peixoto, no Centro de Niterói. Um dos prováveis motivos foi a falta de apoio dos governos locais na logística do fechamento das ruas.

Há também quem diga que o horário dos desfiles no Paraíso/Patronato interferia no andamento da missa da Igreja Nossa Senhora Aparecida, que ocorria no mesmo horário. Quem participou da escola na época, diz que ao passar pela igreja, o carro de som e a bateria precisavam parar suas atividades, retomando-as mais à frente.

A Porto da Pedra contornou esses problemas jogando seus ensaios para mais à noite.

Portal da Loucura da Porto da Pedra em 1997, no samba que conquistou o quinto lugar no grupo especial
Portal da Loucura da Porto da Pedra em 1997, no samba que conquistou o quinto lugar no grupo especial, retornando no sábado das campeãs.

Uma era vitoriosa de Viradouro e Porto da Pedra

O ano de 1997 foi um marco para Porto da Pedra. Em seu segundo ano como desfilante na Sapucaí, a escola conseguiu um memorável 5º lugar, voltando entre as campeãs no sábado seguinte.

Maior ainda foi a emoção da Viradouro, quando, com o enredo “Trevas! Luz! Explosão do Universo”, de Joãozinho Trinta, sagrou-se campeã daquele ano.

Naquele ano, após o fim da apuração das notas, era impossível sair, entrar ou transitar em São Gonçalo. No Barreto, principal entrada do município, a Viradouro comemorava o título inédito e, no Centro da cidade, a Porto da Pedra comemorava a colocação inédita. Hoje sabemos que este foi o máximo de representatividade que o leste fluminense pôde alcançar no quesito Carnaval.

O marco foi ainda mais intenso, pois as duas escolas que a representavam no Grupo Especial desfilaram no domingo pós-carnaval, no Rodo.

Integração entre as escolas do leste fluminense

Mesmo com o sucesso e a proximidade geográfica de ambas, parece que não havia um esforço para que elas se integrassem. Entre os componentes, a regra não dita era: “quando se desfila em uma, não se desfila na outra”.

E um grupo se destaca nesse ponto: a bateria.

Surdo de Primeira da Bateria Ritmo Feroz, da Unidos do Porto da Pedra.
Bateria Ritmo Feroz, da Unidos do Porto da Pedra. Fotografia: Jaylton Pimentel

Um dos promotores desses primeiros passos em direção à integração das baterias foi o Mestre Marcinho. Cria da Viradouro, Marcinho tornou-se um mestre de bateria de sucesso na escola Em Cima da Hora. Por ter se destacado, foi convidado a reger a Ritmo Feroz, a bateria da Porto da Pedra. Por seu histórico, conseguiu atrair alguns de seus parceiros para desfilar pela Porto.

“Eu me lembro do primeiro ensaio do Marcinho como Mestre da Porto da Pedra. Substituía o Mestre Cosme, que já estava na escola desde a ascensão ao grupo especial. Marcinho era um dos diretores auxiliares do Mestre Ciça na Viradouro e isso fez com que muitos de nós fôssemos ajudá-lo no novo trabalho. Na primeira reunião, ficou nítida a hostilidade de ambos os lados: de um lado, a galera da Porto; de outro, a gente da Viradouro, os forasteiros. Foi um começo complicado, mas, ao longo do tempo, o Marcinho conseguiu fazer um intercâmbio entre as baterias”, diz André Churros.

Aos poucos, quando os horários de desfile não interferiam, membros das duas escolas passaram a se frequentar mais, apesar de alguns relatos mencionarem que a Viradouro nem sempre recebesse membros da Porto tão bem.

Joãosinho Trinta na Sapucaí pela Viradouro em 1994
Joãosinho Trinta na Sapucaí pela Viradouro, ainda em 1994, com o enredo “Tereza De Benguela – Uma Rainha Negra No Pantanal”. Foto: Arquivo O Globo / Ivo Gonzalez

Retorno de mídia de Viradouro e Porto da Pedra

Apesar de termos poucos indicadores palpáveis sobre isso nas décadas passadas, é ponto pacífico que ainda há muita lembrança de ambas as marcas, quando o assunto é Niterói e São Gonçalo no grupo especial.

E nesse quesito, a Viradouro pode contribuir mais com sua história campeã.

De 1997 a 2007, a escola do Barreto voltou no Sábado das Campeãs por 9 vezes. Enquanto isso, a Porto da Pedra, que só voltou em 1997, trabalhava para fazer um bom desfile e se manter na categoria.

Joãosinho Trinta recebe Caetano Veloso na quadra da Viradouro, no Barreto em 1998. Foto: Carlos Ivan
Joãosinho Trinta recebe Caetano Veloso na quadra da Viradouro, no Barreto em 1998. Ao fundo, Tony Garrido, Cidade Negra. Foto: Carlos Ivan

Essa diferença marcou a Viradouro como uma escola de ponta, que disputa campeonato e tem cara de campeã. Isso, somado à equipe técnica da escola – que já teve em seu plantel nomes como os lendários Joãozinho Trinta, Mestre Ciça, Dominguinhos do Estácio, além das rainhas de bateria Luma de Oliveira e Juliana Paes em seus auges –, deram ainda mais credibilidade à bandeira da agremiação de São Gonçalo e Niterói.

Não se pode esquecer que, nos carnavais de 1997 e 1998, a Viradouro apresentou os 2 sambas que tiveram uma aceitação popular inimaginável naqueles carnavais e são cantados até hoje: “Vou cair na gandaia/Com a minha bateria/No balanço da mulata/A explosão de alegria” (1997) e “Hoje o amor está no ar/Vai conquistar seu coração/”Tristeza não tem fim, felicidade sim”/Sou Viradouro, sou paixão” (1998).

Acrescente-se a esses sambas o fato de a Unidos do Viradouro, em 1998, ter apresentado o enredo Orfeu, o Negro do Carnaval, baseado no mito grego e na peça de Vinicius de Moraes, que virou filme lançado em 1999, dirigido por Cacá Diegues. Todas as filmagens diretamente ligadas ao carnaval foram feitas na quadra, no barracão e no desfile da escola.

A Viradouro, então, era agora frequentada por personalidades como Caetano Veloso, Cacá Diegues, Toni Garrido, Patrícia França, Murilo Benício, Milton Gonçalves, Zezé Motta, Stepan Nercessian, entre outros. Todos queriam estar e desfilar na escola que, na época, era a escolhida dos atores e demais celebridades.

“Era realmente algo muito fora de comum. De uma hora outra para outra, todas as celebridades que eu via na TV estavam lá na quadra, em todos os ensaios e eventos. Quadra com lotação máxima sempre. Só fui ver tantas celebridades reunidas dentro de uma só escola de samba quando desfilei na Grande Rio em 2010”, diz André Churros.

Pensando nesse histórico, ainda vivo na cabeça de muitos gonçalenses, é um desperdício de energia nutrir qualquer tipo de rivalidade entre Viradouro e Porto da Pedra. Suas trajetórias são distintas, bem como a lembrança de marca que cada uma gerou ao longo do tempo.

Nesse sentido, o mais correto seria São Gonçalo voltar a abraçar ambas como marcas da cidade. Bem como muitos gonçalenses já fazem há anos.

Porém, tudo na vida envolve um fator fundamental para que tudo aconteça: o dinheiro. E é sobre ele que falaremos num post futuro. Abordando o relacionamento entre prefeituras, mídia, empresários e o jogo do bicho.

Matheus Graciano
Matheus Gracianohttps://www.matheusgraciano.com.br
Matheus Graciano é o criador do SIM São Gonçalo, onde fez o meio de campo da revista eletrônica de 2012 a 2020. É designer que programa, escreve e planeja. Trabalha na Caffifa Agência e Consultoria Digital.

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