A vida já nos ensina desde criança. Tomamos como exemplo aquela simples experiência de ciências que tivemos na escola, onde plantamos no chumaço de algodão uma semente de feijão. Aprendemos muito mais que os estágios de crescimento da plantinha, que precisa ser cultivada para germinar e crescer até que se chegue ao tamanho em que possa ser plantada direto na terra, fazendo valer o dito popular de que colhemos o que plantamos.
Sem querer filosofar, e já filosofando, aprendemos também que devemos fazer três coisas antes de morrer. Plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro. Mas se analisarmos, todas as três se resumem à uma só: plantar. Quando escrevemos um livro, plantamos um pedacinho dos nossos conhecimentos para gerações futuras. Quando temos um filho plantamos um pedacinho de nós mesmos para o mundo. Logo, passamos nossa vida inteira plantando.
Fazemos nossas escolhas quanto à semente plantar. Dentre os horticultores, os que plantam e cultivam amor têm a minha admiração. É o caso de José Dautrino, o paulista que abdicou de tudo na vida, casa, trabalho e veio plantar em Niterói o melhor dos jardins.
No dia 23 de dezembro de 1961, seis dias depois do incêndio do Gran Circus Norte-Americano, José Datrino acordou determinado em fazer alguma coisa em prol das pessoas que sofriam com a perda dos entes queridos pela tragédia. Então, rumou em direção a Niterói e bem no lugar onde o fogo consumiu mais de 500 pessoas, a maioria crianças, Dautrino plantou sobre as cinzas o mais belo jardim e a mais bela horta e ali ficou por 4 anos curando as feridas de familiares envolvidos na tragédia com palavras de amor e bondade. Alí, naquele cantinho marcado por uma tragédia, nasceu o Profeta Gentileza.
Naquele mesmo ano de 1961 enquanto Gentileza, cultivava o seu jardim em Niterói, nascia no bairro da Covanca em São Gonçalo, Aílton Silveira. Ele não sabia, mas o destino reservaria pra aquele menino pobre o mesmo dom que dera ao paulista Dautrino.
Da Covanca, Aílton foi ainda criança parar em um quartinho no alto do morro do bairro de Tenente Jardim em Niterói, morando com a sua avó e seus dois primos, Jorge e Nazareth. Sua avó trabalhava duro para dar o que comer para os netos. As condições eram precárias, pois não dormiam em colchões e sim em uma esteira de palha dura. A preparação da comida era feita em um fogareiro onde se catava madeira como lenha. Banheiro não existia.
Com tanto sofrimento, Aílton nunca teve a oportunidade de estudar. Com 14 anos, montou um carrinho com ripas e rodinhas de rolimã e corria para feira levar as bolsas de compras das senhoras. Com o dinheiro da generosidade dessas mulheres, Aílton vivia. No final da feira, ele catava sobras de frutas e legumes que podia alimentar a ele e seus primos. O dinheiro que conseguia com o transporte deixava todo ele na mão da sua avó.
Ao completar 21 anos, sem nunca ter entrado em uma escola, Aílton era analfabeto e só depois de muito esforço pessoal, conseguiu desenhar seu próprio nome. Foi graças a esse esforço e mesmo sem entender, mas agradecendo a Deus, que conseguiu um emprego de cobrador de ônibus na Viação Garcia. Não sabia ler nem escrever, e muito menos fazer contas, mas Aílton com uma blindagem de armadura passava um dia após o outro, gravando as cores das notas e aprendendo a fazer conta naquele banco que não era o da escola, e sim o da vida. Com o coração que não cabia no peito, às vezes tirava do próprio bolso para completar a passagem de alguém que não podia pagar.
Aílton, além de aprender a fazer conta, teve a oportunidade de aprender o ofício de servente de pedreiro. Na mesma época, seus olhos avistaram Andreia. Amor à primeira vista. Andreia conquistou o coração do rapaz e logo marcaram o casório. Mas, infelizmente, o amor não foi adiante e com apenas um ano de casados o casal se separou. Aquele ponto da história de Aílton foi fundamental para sua escolha de vida.
Nas palavras do próprio Aílton, onde ele diz que na Bíblia, aquele que não vem por amor, vem pela dor. E assim foi com ele, chegou à igreja Assembleia de Deus, pela dor de um coração apaixonado que não queria desistir do amor de Andréia. As lágrimas saiam como rios pensando na amada. Não tinha força para nada. Deixou de comer e o pastor foi seu único amigo e conselheiro. Com o aval do pastor, Aílton fez da igreja sua moradia e entendeu que aquele era seu destino. Estava casando novamente, mas nada de noivas, e sim Jesus Cristo.
Então aceitou a Jesus e mais a vida que lhe foi escrita para ser vivida. Passou a morar sozinho e falar do amor de Deus para todos ao seu redor. Conseguiu um emprego como vigia na sede da Fundação Parques e Jardins de São Gonçalo e lá pregou o amor e a bondade, assim como o Profeta Gentileza, plantou e cultivou no terreno da sede uma horta.
Hoje, já aposentado, Aílton continua ali no mesmo lugar, na Estrada do Rocha, na região da Água Mineral, falando para todos que passam do amor de Deus. Mora lá em cima do morro. Com o dinheiro da aposentadoria, paga com muita dificuldade um aluguel que por muitas vezes não sobra para se alimentar. Mas, como ele mesmo diz, Deus está no poder e amigos ajudam com quentinhas.
Não é à toa que a passagem favorita de Aílton é João 3:16: “Porque Deus tanto amou o mundo que deu o seu único filho, para que todos que nele crer não pereçam, mas tenham a vida eterna.” Independente de qual seja o seu credo ou religião, católica, evangélica, espírita, candomblecista, umbandista ou até mesmo ateu, há de se convir que sem amor nada seríamos, como na letra do poeta.
De gênio e louco todos nós temos um pouco. Parabéns a esses “loucos” como o paulista Datrino e o gonçalense Aílton, que semeiam amor por onde passam.
Afinal de contas: GENTILEZA GERA GENTILEZA