Você já pegou o 371, Tiradentes-Praça Seca? Até pouco tempo, nem eu.
Já fiz diversos caminhos para chegar à zona norte. Mas nunca o itinerário desse ônibus. Basicamente, ele vai por São Cristóvão, passando na porta da Mangueira, de Manguinhos… Aliás, se você não é do Rio, copie “Manguinhos Rio de Janeiro” e cole no Google Imagens. É mais ou menos por aí. Para completar a emoção, quando o ônibus parou no ponto da localidade, uma saraivada de barulhos parecidos com “bombinha” causaram apreensão. Se não foram bombinhas… Ah, você sabe. Enfim, nada que abalasse a paz do local.
No estado do Rio de Janeiro, a região metropolitana é dividida entre a faixa de areia e o resto. Sim, o resto. Sem papinho de guerra de classes, por favor. O que há é uma separação, simples assim. Só há um erro na areia: as favelas. Por uma conjuntura histórica e não planejada pelos eugenistas do passado, elas foram promovidas de apêndices a órgãos vitais. Os morros litorâneos poderiam ser todos como Santa Teresa. Mas alguém “errou” o projeto. Quem foi, eu não sei. Só sei que ”nunca antes na história desse país”, essa diferença bruta se tornou tão interessante.
Talvez, interessante não seja a melhor palavra. Mas como eu não sou alarmista, otimista, nem pessimista, é ela que vou usar.
Sozinho, o Rio metropolitano (ou grande rio) elege governador, senador, contribui com uma boa fatia de votos para eleger um presidente e formar parte da bancada do congresso federal. Mais relevante é que parte da “influência cultural” do Rio para o Brasil vem dessa parte. O restante está nas fotos bonitas, que nunca vão mudar de lugar (Pão de Açúcar, Corcovado, Lagoa, etc). O modo de vida dessa população é expressa nos funks, carnaval e em tudo mais que se queira usar para dar “brasilidade”. Aliás, sem esse povo, nada disso existiria. Talvez ainda estivéssemos dançando polka, valsa, fingindo que gostamos de bossa nova ou alguma coisa do tipo. Danças indígenas? Sei lá. Dela sai um link direto com a zona leste paulistana, periferias de Brasília, Pernambuco, Bahia, Pará e de quem mais estiver espelhado nesse “jeitinho todo especial” de ser ex-pobre, agora, talvez, classe-média.
De Santa Cruz, adentrando a zona Norte, Baixada, São Gonçalo e terminando em algumas partes de Niterói, existe um cinturão imaginário. Uma rede de gente que gosta de ser chamada de carioca, mas não faz ideia do que isso significa. Ser carioca significa praia, sol, gente feliz. Não é isso? Mas quantos desses convivem com a praia ao invés do lixo, valões e a poeirada das ruas? Sem falar nos inúmeros fluminenses que confundem a nomenclatura com o time tricolor das laranjeiras e se declaram… cariocas? Sim, quantos!
Outro detalhe é a intolerência religiosa de alguns grupos evangélicos com a umbanda e o candomblé (mais conhecidos como “macumba”) nas zonas mais pobres. A notícia vem no momento em que a faixa de areia, numa vontade de “volta às raízes”, se mostra, mais do que nunca, devota de São Jorge e Iemanjá. Num outro vértice mais curioso, as últimas pesquisas para governador revelaram que os dois campeões de intenção de voto são… evangélicos! Surpresa? Se olhássemos a história, talvez entendêssemos o porquê de Getúlio ter se aproximado da igreja católica, uma vez que ele nem religião tinha. Deus e a política juntos como sempre.
Com dinheiro, cultura, poder e internet na mão, eles (ou nós) são bem mais que apenas um novo poder econômico.
[…] exatos dois anos atrás, publiquei um texto chamado “O Cinturão Fluminense”. Nele, o comentário principal era sobre esse grande “cinturão” que as cidades […]