Algumas vezes na vida, a gente acha que passa por problemas desnecessários, que não deveríamos passar. Dessa vez, pelo menos dessa vez, sinto que tive que passar por isso. Só assim, pude sentir na pele o que o nosso querido poder público anda aprontando com a gente, só para garantir um trocado.
Pátio da TransGuard e SEMTRAN, entre o Posto de Gasolina e o Abrigo Cristo Redentor. Agora basta saber de quem é esse terreno alugado, na Estrela do Norte – São Gonçalo.
O início da história: do IPVA ao Detran
No início deste caótico ano de 2015, separei aquele dinheirinho para o IPVA. Já sabia que o governo do estado do Rio de Janeiro estava em crise. Ou melhor: está em crise. Com graves problemas financeiros por conta da queda do preço do petróleo, da Petrobrás se afundando na Operação Lava-Jato, entre outros problemas afins, é lógico que sobraria para nós, com muita Lei Seca, blitz e reboques por aí. Por isso, tratei de pagar logo o bendito do “Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores”.
Porém, mesmo com o meu dinheiro em sua caixinha, o faminto estado não deixaria esse meu adiantamento sair impune. No auge da polêmica com os extintores de incêndio, tive que gastar mais R$130,00 reais para saber que, meses depois, ele não seria mais necessário.
Extintores ABC: segundo a antiga resolução, quem não tivesse, também poderia ser rebocado.
No Detran, ainda no 1º semestre, o sistema não me permitia fazer a marcação da vistoria. Aliás, quis o homem que “vistoria obrigatória” só existisse no estado do Rio de Janeiro. O sistema do site do Detran não agendava a data. Depois de um tempo, passou a me mandar para cidades bem longes de São Gonçalo ou Niterói. Ou seja, se as agências mais próximas do Detran não estava conseguindo vistoriar todos os carros, eu que enchesse meu tanque com uma gasolina cara para resolver um problema que é deles.
Polícia é para proteção, não arrecadação.
Há poucos meses atrás, o projeto do deputado federal Walney Rocha (PTB-RJ) foi aprovado na Câmara. Segundo este, não precisaríamos mais de vistorias no Rio de Janeiro, único estado que ainda pratica isso. O projeto só aguarda a aprovação na Comissão de Justiça do Senado.
Confira a notícia: http://extra.globo.com/noticias/rio/projeto-de-lei-que-poe-fim-as-vistorias-de-carros-aprovado-na-camara-17233754.html#ixzz3jH4zJLii
Voltando à vida real, eis que no dia 9 de novembro, segunda-feira, às 21:30, fui parado numa blitz da Polícia Militar. Eles pediram os documentos e, de cara, lancei: “Ainda não fiz a vistoria”. O policial foi ainda mais direto: “Então, vamos rebocar!”
Sozinho no carro, numa blitz em frente ao Cemitério São Gonçalo. Ali estava eu, numa cena lastimável.
Entretanto, prestei bastante atenção ao processo. Especialmente no diálogo entre os Policiais Militares:
– Quantos já tem aqui?
– 1, 2, 3, 4, …7!
– Ih, então falta mais um aqui! Vamos fazer o seguinte: a gente pega mais 1, fecha 8. Depois vamos lá na entrada do Boaçu para pegar mais 7. Aí, a gente fecha por hoje.
– Tá bom. Vamos fazer isso.
Imagem ilustrativa da ação da polícia no reboque de veículos.
Bem, para qualquer um que estivesse ouvindo a conversa, estava claro que havia uma cota de 15 carros a serem rebocados para o depósito por aqueles funcionários da Lei. Sim, da Lei, não da arrecadação do estado.
Acredito seriamente que a desvalorização da polícia começa em atos como esse. Ao invés de usá-la para fins de proteção e prevenção, ela é usada para tudo, inclusive como um arrecadadora de impostos. Nessa “saga”, ouvi de pelo menos 3 pessoas que os policiais estão recebendo por carro. Ou seja: não fique de malandragem tentando subornar a polícia. Está arriscado a tomar uma “voz de prisão”, saindo dali algemado.
Carro lacrado e levado às 22:05 de 9 de novembro de 2015. O dia seria longo na terça.
SEMTRAN: prefeitura de São Gonçalo e a sua má vontade em pessoa
Imagina um lugar quente. Pensou? Agora, adicione isso a um dia abafado, num espaço de pouco mais de 3 metros quadrados, sem nem um ventilador. Conseguiu visualizar? Agora, saiba que faltam banheiros e bebedouros no local. Sim, essa é a fórmula perfeita para que as pessoas fiquem ainda mais irritadas.
Adesivo da SEMTRAN (Secretaria de Trânsito de São Gonçalo, Rio de Janeiro).
A má vontade da funcionária da Secretaria Municipal de Transportes não poderia ser pior. Lá de dentro, o ar-condicionado da salinha gelada dela passava entre o espacinho do vidro. Nós, aqui fora, no calor. Mesmo assim, ela tinha dificuldade em explicar sobre o que fazer caso não tivéssemos algum documento requerido naquele momento.
O processo da SEMTRAN é muito bem feito. Ele foi desenvolvido para te enrolar ao máximo, de modo que você tenha que ir e voltar algumas vezes para conseguir uma simples guia de pagamento. Assim, eles ganham tempo para te fazer pagar mais uma estadia. E foi isso que aconteceu comigo.
Funcionários da TransGuard manejando o processo de liberação dos veículos.
TransGuard: desvendando o caça-níquel da prefeitura de São Gonçalo
A empresa TransGuard (CNPJ 11361353000303) e a SEMTRAN se uniram para servir o que há de pior em serviços, conseguindo algo que é uma prática comum no estado do RJ: HUMILHAR O CONTRIBUINTE. Para que não restem dúvidas, vou listar ponto a ponto para você entender como a indústria do reboque funciona, nos fazendo pagar muito mais do que está escrito.
Tabela de “estadias” e reboques da TransGuard, cujos valores são regulados pela prefeitura de São Gonçalo.O decreto pode ser encontrado nesse link: http://www.jusbrasil.com.br/diarios/76397488/dom-qsd-rj-10-09-2014-pg-1
CRONOGRAMA DOS ABSURDOS
#1 Estadias não são diárias: a cobrança pelo absurdo:
O 1º absurdo da TransGuard e SEMTRAN é a cobrança das “estadias”. Segundo a “regra” deles, você deve pagar o reboque + estadia. Entretanto, veja um exemplo: Imagine que sua moto/carro foi pego às 23:00 da noite, seja numa blitz ou rebocado na rua, e levado para o depósito. Se passar da meia-noite, já conta a 2ª estadia. Isso! Nenhum estacionamento, hotel, aluguel de nada conta dessa forma. Esse jeito “inovador” te faz pagar 2 diárias de uma vez!
Isso faz parte da indústria. Entendeu por que a polícia pega mais carro e moto à noite e no fim da tarde? Isso te “obriga” a pagar duas vezes. Sim, 2 vezes.
Primeira guia gerada pela TransGuard, cobrando o valor de duas “estadias”.
#2 Guia de pagamento e a premeditada dificuldade de pagar
Depois da SEMTRAN me fazer de palhaço, me fazendo ir e voltar 3 vezes àquele local, finalmente consegui pegar uma guia de pagamento às 16:20. Como não podíamos pagar lá, algo impensável hoje em dia com tantos meios de pagamento, e com os bancos já fechados, a atendente disse que era possível pagar na Loteria… será?
Sem almoço, depois de idas e vindas à casa e ao cartório, para “autenticar” uma declaração dizendo que o carro era nosso, corremos para a lotérica acreditando que “daria tempo” de pegar o carro… Tudo em vão!
Após uma pequena fila, fui atendido na lotérica indicada, ali na 18 do forte, entrada do Mutuá. A atendente pegou o documento e já disse logo:
– Ih, TransGuard? Só amanhã. O limite deles para depósito é de 500,00 reais por dia. Agora, só amanhã!
Desolado, saí dali e voltei para a casa, na esperança de conseguir pagar na QUARTA-FEIRA pela manhã.
Esse comprovante foi gerado pela própria lotérica, para mostrar a hora e o motivo de ela não ter recebido o documento. Segundo outras pessoas que estavam na mesma situação, apenas os 3 primeiros atendidos na lotérica conseguiram fazer o depósito. Com um limite de 500 reais, era óbvio que isso iria acontecer.
#3 Terceirizadas e a máquina da prefeitura
Como a prefeitura não pode receber dinheiro diretamente, a não ser que seja de impostos, ela contrata essas empresas terceirizadas para arrecadar para ela. No caso, a Transguard me deu um papel que não chegavam nem a ser um boleto (como mostrado acima). Agora me diz: como uma empresa que presta serviço para a prefeitura tem um limite tão baixo para receber nas Loterias? Por que ela não recebe no crédito ou débito, se ela é uma empresa registrada?
Perguntas que só podem ser respondidas com investigação do Ministério Público.
#4 Ninguém aceita guia com data vencida
Na quarta-feira pela manhã (lembrando que o carro foi apreendido na noite de segunda-feira), lógico que o pior aconteceu. Por um erro da empresa, com seu limite pífio para pagamento nas Loterias da Caixa e não aceitação da guia por causa da data vencida, tive de ir novamente à TransGuard para gerar uma nova guia.
#5 Estadia não é diária. Passou um dia? Vamos cobrar!
Na hora de gerar a guia, a atendente da TransGuard me vem com uma guia no valor de R$245,66. OI?! Sim, eles fizeram isso. Por um erro deles, o que já era um abuso, tornou-se uma agressão a todas as lógicas e direitos. O carro mal tinha 30 horas no pátio e eles estavam cobrando por 3 estadias, uma “diária” literal. O absurdo foi formalizado.
Depois de muita revolta, confusão e argumentação, logo vimos que ou era isso ou nada. O “supervisor” até me sugeriu tentar pagar a guia do dia anterior. Mas, peraí! EU TENHO QUE TRABALHAR. Não posso ficar 80 minutos na fila da Caixa Econômica e tomar um “Não posso receber, Senhor”.
Paguei a guia mais cara, com data de vencimento do dia e na boca do caixa da Caixa Econômica Federal. Me senti nos anos 80 ou 90 novamente, provando do atraso que tanto combatemos na cidade.
Nova guia gerada pela Transguard – um absurdo da Prefeitura de São Gonçalo que colabora com essas empresas.
#6 Pagamos na CAIXA e voltamos para a Transguard. Será que pegaremos o que é nosso?
Depois da extorsão legitimada pela Prefeitura de São Gonçalo e pelo Governo do Estado do Rio de Janeiro, finalmente pegamos o carro e saimos de lá. Fiz o vídeo e já comecei a compreender que não há outro jeito: terei de recorrer à justiça para corrigir esse absurdo.
O que aprendi com tudo isso?
A lição mais importante que ficou é que “o estado é implacável” quando o assunto é tomar o seu dinheiro. Infelizmente, nós, brasileiros, somos muito pacatos e aceitamos esses desmandos como se fosse algo normal.
Mesmo com IPVA pago, tentativas de marcação de vistoria dificultadas pelo próprio DETRAN, compra de extintor que não será mais exigido, cobranças de pedágios, entre outros impostos que pagamos, mesmo com tudo isso, ainda somos tratados como se quiséssemos “não pagar” e enrolar o estado. Pelo contrário, se o estado facilitasse a vida das pessoas, com serviços que funcionassem decentemente, tenho certeza que a maioria das pessoas seriam muito mais felizes.
As “indústrias da dificuldade” estão aí. Todas famintas para que você tenha muitos problemas e, como sempre, ganhe uma bela punição do estado.
SEMTRAN e Transguard, o processo de vocês está sendo elaborado. Se o caminho é a justiça, aí vamos nós.
Estou com meu veiculo preso na famingerada transguard desde o dia 18/10 com varias tentativas de pagar a cobrança e nao consigo. Carro apreendido somente por nao ter vistoriado..documentos todos pagos.
Li todo seu post, agora eu te pergunto o que a Transguard tem haver com tudo isso que aconteceu com vc? É uma empresa terceiriza, presta serviço pro estado, recebem ordens então complica. Lamentável sua história, o único jeito é andar certo.
Eu acho que todas as indústrias de carro terão um bom lucro, principalmente essa. Só estou aqui pra fazer um trabalho, não estou aqui pra reclamar. Só tenho 11 anos, mas uma coisa é que esses comentários mostram é que essas empresas que roubam o povo vão desmoronar.
O pior de tudo isso, é que tudo que arrecadam com essas artimanhas é para manter a máquina corrupta do Município para sustentar e comprar governabilidade, bem como as referidas para o Estado e União. É o roubo institucionalizado com o aval da Justiça. Todos de mãos dadas contra o Cidadão contribuinte. Será que as “otoridades” estão em dia com a documentação de seus automóveis?
[…] A “indústria da multa” não ganhou esse nome à toa. Sou motorista há uns 15 anos e já ganhei algumas multas nesse período. Ainda sim, sou pedestre há muito mais tempo. Sei bem a diferença que faz ter um […]