Aqui você vai ler uma sequência de fatos baseados em dados eleitorais, históricos e de renda que nortearam as últimas eleições de 2000 a 2020 para prefeitos em São Gonçalo.
Diante de pesquisas fraudulentas que já povoam o pleito atual, eu, Matheus, estou expondo minha visão olhando para o passado. Que isso não desanime as militâncias. Nada impede que, em 15 de novembro, tenhamos uma grande surpresa. Afinal, resultado de urna só sai no dia da eleição.
Prefeitos de São Gonçalo estão divididos entre leste e oeste da cidade
Em 1492, Portugal e Espanha dividiram entre si as terras americanas com uma linha imaginária chamada “Tratado de Tordesilhas”. As terras a leste eram de Portugal e as a oeste de Espanha.
Aqui em São Gonçalo, o nosso tratado de tordesilhas se chama Rio Alcântara. Ele divide os dois municípios imaginários que não se dividiram em 1995.
Quando olhamos as vitórias nas urnas de cada distrito, é possível ver que os prefeitos em São Gonçalo tem raizes territoriais bem identificadas por quem vota neles. É como se houvesse um duelo de Leste vs. Oeste a cada pleito, sendo o leste Alcântara e o oeste São Gonçalo.
Numa cidade com baixo orçamento como a nossa, os eleitores sabem que precisam eleger quem priorize seu território. Mesmo que, num determinado momento, a prefeita ou prefeito da vez faça pouco ou nada pelos dois lados.
Minha leitura sobre o “lado” de cada prefeito de 1989 até 2020:
Edson Ezequiel – São Gonçalo
João Bravo – São Gonçalo
Henry Charles – Alcântara
Aparecida Panisset – São Gonçalo
Neilton Mulim – Alcântara
José Luiz Nanci – São Gonçalo
A base eleitoral testada nas eleições gerais anteriores
Quando faço minhas análises, prefiro ter como corte temporal o ano de 1988, quando foi promulgada a Constituição que usamos atualmente. O nosso período legitimamente democrático.
A partir de 1989, quase todos os prefeitos foram testados em eleições gerais antes do pleito municipal. A exceção nesses 30 anos foi João Bravo. Este foi chefe de gabinete na gestão de Edson Ezequiel, entre 1989 e 1992. Era uma época onde não havia reeleições nos cargos executivos, sendo Bravo foi o escolhido para a sucessão.
Em suma, fora Bravo, todos foram eleitos para cargos legislativos a nível estadual ou federal, na eleição geral anterior às eleições municipais que disputaram e venceram. Mas há uma
Lista dos prefeitos e suas eleições:
Edson Ezequiel foi deputado estadual em 1988, com 142 mil votos, antes de vencer o pleito para a gestão 1989–1992; eleito deputado federal em 1995-1996 e, logo após, eleito prefeito para o mandato 1997-2000.
Henry Charles foi deputado estadual entre 1999–2000. Logo depois, foi eleito a prefeito para a gestão 2001–2004.
Aparecida Panisset foi eleita deputada estadual em 2002, com 50.338 votos. Foi eleita e reeleita para as gestões 2005–2008 e 2009-2012.
Neilton Mulim foi eleito, em 2006, para deputado federal com 44.671 votos. Em 2010, foi reeleito à Câmara Federal com 41.480 votos. Elegeu-se prefeito em 2012.
José Luiz Nanci teve sua primeira eleição para a Alerj em 2010, com 28.798 votos. Em 2014, foi reeleito a deputado estadual com 36.356. Em 2016, tornou-se prefeito de São Gonçalo.
Essas duas camadas, base eleitoral na campanha anterior e confronto leste vs oeste são os critérios que uso para ter uma noção de para onde os ventos irão no pleito seguinte. E em 2020, se a política gonçalense não der um “cavalo de pau”, o cenário tende a se repetir.
A seguir, vou falar um pouco sobre as questões eleitorais com esse ponto de vista. Lembro que, quando se trata de eleição, todo mundo tem um palpite sobre o porquê da vitória. Evito entrar nesses detalhes. Gosto de olhar os números mesmo. 🙂
Eleições 2000 – Chame o doutor!
“Chame o Doutor!” Quem com mais de 30 anos não se lembra dessa frase? A eleição de 2000 foi a primeira com reeleição para prefeitos. Edson Ezequiel, tentava ocupar a cadeira novamente e chegou em primeiro, no 1º turno, com 169.332 votos, enquanto Henry Charles recebeu 161.655. Mas após 12 anos de PDT no poder, havia um desgate natural em relação à Ezequiel. No 2º turno, a virada foi inevitável: 243.590 para o “Doutor” e 186.837 para o engenheiro.
Nessa eleição, é possível ver com mais clareza o duelo entre São Gonçalo e Alcântara. É preciso lembrar que Henry Charles foi um dos defensores da proposta de emancipação de Alcântara, em 1995. E é muito possível que essa percepção tenha feito parte do imaginário dos “alcantarenses”.
Anos depois, tanto Ezequiel quanto Charles se envolveriam em ações de improbidade administrativa. Ezequiel passou continuou sendo eleito deputado federal nas eleições de 2002, 2006 e 2010, até se aposentar em 2014. Charles sumiria da vida pública.
Perceba que, 12 anos depois, o mesmo fenômeno aconteceria. Curioso, não?
Eleições 2004 – O tijolinho
A eleição de Aparecida Panisset era algo esperado. Panisset foi eleita vereadora em 1996, com 4.157 sufrágios. Na eleição seguinte, em 2000, teve 14.417 votos. Aliás, essa foi uma eleição de grandes votações para vereador. Vale ver quem foram os outros muito bem votados (alguns você conhece bem).
Com esse caminhão de votos, Maria Aparecida Panisset tentou e foi eleita em 2002 à deputada estadual, com 50.338 votos. Essa vitória a cacifou na disputa pela cadeira de prefeita em 2004.
Essa eleição é um pouco fora do padrão pela popularidade da candidata e pela impopularidade dos outros dois candidatos. Henry Charles, ainda prefeito, tentou reeleição e só teve 29.206, cerca de 6,2% do total, para você ter uma dimensão da rejeição.
Já Graça Matos, a grande adversária de Aparecida, tinha sido eleita com 10 mil votos à menos para o mesmo cargo de deputada estadual 2 anos antes (40.878 votos). Ela também simbolizava o período de seu marido, o ex-prefeito Edson Ezequiel, que tinha perdido 4 anos antes.
Nesta eleição, Graça ficou em 2ª lugar, com 172.752, enquanto Panisset se elegeu em 1º turno, com 240.945 votos, pelo DEM, o que correspondia a 51,95% dos votos válidos.
Nesta época, Panisset e seu irmão, também político, Márcio Panisset, mantinham um Centro Social, uma dessas anomalias que políticos mantêm para ter o voto dos mais pobres. Em geral, são serviços médicos e assistências sociais, as quais os políticos deveriam trabalhar para que o serviço público fornecesse, não eles. O centro deles ficava no Paraíso, na rua Visconde de Itaúna, caminho para o Gradim.
E um detalhe: nessa eleição, ambas as candidatas mais votadas eram de “São Gonçalo”. O candidato de Alcântara era o prefeito impopular.
Eleições 2008 – O bom momento econômico
Prefeitos que governam em bons momentos econômicos tendem a se reeleger. Quem governa com “dinheiro para gastar” tende a ser mais bem visto que quem governa de forma austera aqui no Brasil.
E com Maria Aparecida Panisset não foi diferente. Ela ampliou a votação anterior, chegando a 270.591 votos, cerca de 56%. Graça Matos perdeu novamente, reduzindo sua votação para 100.327 sufrágios.
Porém, havia uma novidade, a candidatura de Altineu Cortes, que teve 91.108 votos, cerca de 18% dos votos válidos. Ele é sobrinho de José Carlos Coutinho, político que já tinha sido deputado federal e candidato a prefeito em 1996 (ficou em 3º lugar). Sua base eleitoral era a região de Santa Izabel e adjacências.
Era a candidatura da cidade Alcântara se fazendo presente novamente. Enquanto isso, São Gonçalo brigava para decidir a sua representante.
Eleições 2012 – Alcântara vence novamente
Essa eleição é parecida com a de 2000 num aspecto: ela termina com a vitória do representante de Alcântara a partir de uma virada no 2ª turno. Ambos os pleitos foram respostas dos eleitores contra governos desgastados, que já estavam há 2 ou 3 mandatos no governo. Curiosamente, ambos do PDT.
Nesse pleito, as duas camadas de análise se fazem presentes. Porque além de ser uma vitória de Alcântara sobre São Gonçalo, o candidato da continuidade de Panisset não tinha sido validado, ou seja, eleito. Na eleição geral de 2010, dois anos antes, Adolpho Konder tinha conseguido 35.800, tornando-se apenas o suplente e dependendo da transferência de votos de Aparecida Panisset para se sobressair.
Ao final do 1º turno, Konder consegue alcançar 192.727 votos. Em segundo lugar, Neilton Mulim consegue fazer 116.721, cerca de 3000 votos a mais que a terceira colocada, a ex-deputada Graça Matos que, naquele momento, perdia sua 3ª eleição para prefeita de São Gonçalo.
E no 2º turno, a virada aconteceu. Com 265.579 sufrágios, cerca de 56% dos votos válidos, Neilton Mulim varreu Adolpho Konder, que conseguiu chegar a 202.157 votos. O resultado das urnas era claro. No lado Oeste, o candidato da Aparecida ganhava. Nas urnas do Leste, o vitorioso era Mulim.
Lembro também que Neilton vinha de 2 eleições para o Congresso Nacional. Era deputado federal há 6 anos e tinha grande representatividade com sua base. Para muitos, na cidade Alcântara, simbolizava uma possível mudança. Quatro anos depois, mais uma decepção se concretizava.
Eleições 2016 – ganhou quem tinha a menor rejeição
A eleição de José Luiz Nanci foi a vitória do menos rejeitado. Numa eleição sem favoritos, os candidatos que passaram ao 2º turno tiveram uma diferença de 896 votos entre eles. Nanci, então deputado estadual eleito, com 82.848 e Dejorge, suplente de deputado federal, com 81.952 votos.
Chamo a atenção para o fracasso do prefeito que tentava a reeleição, Neilton Mulim, e seu amargo 3º lugar, com 65.922. Também lembro que o 4º lugar, o então desconhecido Brizola Neto, com o apoio da ex-prefeita Aparecida Panisset, conseguiu marcar 49.599 votinhos. Em suma, uma eleição parelha, com votos muito pulverizados.
Quando a questão território é posta à mesa, Dejorge Patrício, na teoria, seria um candidato São Gonçalo. Em 2012, em sua vitoriosa eleição a vereador, foi o candidato mais votado para o legislativo municipal, com 6.391 votos. Neste pleito, sua base era o bairro Boaçu, onde ele conseguiu quase 2.500 votos, com reflexos na Brasilândia, onde conseguiu mais cerca de 1.200, e no Mutuá. Porém, na falta de um candidato legitimamente alcantarense, foi o escolhido pela população do leste da cidade.
É possível também que a imagem de Dejorge como homem do povo tenha sido melhor recebida pelo leste da cidade. Há uma sensível desigualdade de renda entre São Gonçalo e Alcântara, sendo a última mais pobre e com menos infraestrutura.
Já José Luiz Nanci, sem dúvidas, é um candidato de São Gonçalo. Mora no Zé Garoto há anos, em frente ao Pronto Socorro Central, frequentava a Igreja Nossa Senhora das Graças, no Porto Velho, e faz questão de mostrar que curte a Praia das Pedrinhas. Conseguiu formatar em si o “gonçalense da antiga”, identificando-se com o lado oeste.
Na eleição geral de 2014, Nanci foi mais vitorioso
Em 2014, Dejorge Patrício foi candidato a deputado federal, obtendo 30.533 votos. Destes, 26.281 foram dentro de São Gonçalo. E em eleições sem favoritos, esse dado passa a fazer parte do cenário.
Nanci foi reeleito a deputado estadual com 36.356 votos em 2014, com 30.067 dentro de São Gonçalo. Além disso, Zé Luiz também contava com o nome de sua família sendo uma marca reconhecida dentro da cidade.
Nesta campanha, Dejorge passou por uma onda de ataques que envolviam histórias complicadas que colaram no candidato. Nanci surfou na rejeição do seu oponente, ganhando com 221.754 votos contra 191.699 de Patrício.
Ainda sim, mesmo parecendo uma eleição diferente das últimas, a de 2016 parece ter sido um exemplo de pleito que se repetirá em 2020.
Eleições 2020 – a lógica se confirmou
A eleição para prefeito de São Gonçalo, em 2020, se assemelhou a de 2016. Novamente, um prefeito impopular, Nanci, tentou a reeleição. Por outro lado, vimos o candidato a suplência de deputado estadual em 2018, o Capitão Nelson, mas que conseguiu assumir a vaga por conta da prisão do titular do partido, chegando à reta final em segundo lugar, mas virando o jogo nos últimos instantes.
Foi uma eleição menos aberta que a de 2016, que contou com a surpresa de outro suplente de 2018, o candidato Dimas Gadelha, do PT.
Mas a inexistência de uma personagem com a “cara” do lado Oeste (São Gonçalo), permaneceu. Já no lado Leste (Alcântara), houve muitos disputando o mesmo voto. Porém, o mais identificado com a região, sendo o seu reduto eleitoral, teve êxito. Em uma das zonas do lado leste, Nelson Ruas ganhou de lavada, confirmando a gangorra de escolhas.
Agora é aguardar os próximos anos, sempre de olho nessa lógica regional que se repete há mais de 30 anos.