São Gonçalo não é comunidade: morro vs. asfalto não funciona por aqui

Bairro Paraíso, São Gonçalo domingo à tarde. Foto: Matheus Graciano / SIM São Gonçalo
Bairro Paraíso, São Gonçalo domingo à tarde. Foto: Matheus Graciano / SIM São Gonçalo


Mais uma vez, em setembro de 2017, a Riotur apaga as favelas do mapa. A medida do órgão responsável pelo marketing da cidade do Rio visa esconder nossas desigualdades dos turistas, criando uma falsa sensação de segurança.

Para quem é local, sabemos que segurança mesmo é conhecer bem o território. Ou estar com pessoas responsáveis que o conheçam.

O que a princípio parece bobo, na verdade tem reflexos bem maiores. Eles pegam em cheio a percepção não só das favelas, mas de todas as cidades do cinturão fluminense, aquelas que estão ao redor da Baía de Guanabara.

Vista da Ponte Rio-Niterói de São Gonçalo. Foto: Fernando Bittencourt
Vista da Ponte Rio-Niterói de São Gonçalo. Foto: Fernando Bittencourt

Municípios vizinhos da capital são “só mais uma comunidade”

Desde quando comecei a levar as questões de São Gonçalo para a capital, os encontros sempre revelaram a categoria que nos enquadram. Como estamos fora do eixo financeiro, ganhamos sempre o nome de “comunitário”. Mídia comunitária, jornalzinho comunitário, serviço comunitário, mesmo falando para a 2ª maior cidade do estado do Rio de Janeiro.

Chamar cidades com mais 500 mil, 800 mil ou 1 milhão de habitantes de “comunidade”, como é o nosso caso, além de bizarro, mostra a completa cegueira da comunicação brasileira.

Entretanto, a falta de visão vem de casa, literalmente. Afinal, boa parte de quem trabalha no ramo da comunicação mora no eixo carioca Centro–Zona Sul–Barra, de onde também é possível ver a lógica que vamos explicar a seguir.

Bairro Boa Vista em São Gonçalo fotografado atualmente em 2017.
Bairro Boa Vista em São Gonçalo fotografado atualmente em 2017. Foto: Adriana Xavier.

Morro vs. Asfalto: aqui não funciona assim

O primeiro lugar batizado como favela, segundo nossos historiadores, é onde hoje conhecemos por “Morro da Providência”. Já naquele momento, a distinção entre pobres do morro vs ricos da parte baixa, se consolidou.

Com o crescimento da então capital do Brasil, que se expandia além do Centro da cidade, novas favelas nasciam em outros morros. Enquanto isso, a classe média se estabelecia nas ruas calçadas que, posteriormente, ganharam a manta asfáltica.

Consequentemente, a oposição entre pobres vs ricos ganhou esse eufemismo de “morro vs asfalto”. Na verdade, ambos se retroalimentam, uma vez um dependem mutuamente da mão de obra barata e do dinheiro disponível.

Mas essa diferença social tão drástica tem extensão limitada. Alem do eixo Centro – Zona Sul, iremos encontrar exemplares na região da Grande Tijuca e Niterói. No restante do território da região metropolitana é mais difícil sentir essa forte segregação, uma vez que o acabamento urbano do “asfalto” é deficiente. Vide o caso de São Gonçalo.

McDonalds e Assai no Alcântara em São Gonçalo
McDonalds e Assai no Alcântara em São Gonçalo. Foto: Matheus Graciano / SIM São Gonçalo

São Gonçalo tem favelas, mas sem áreas ricas

Isso não quer dizer que não existam regiões mais pobres que outras no restante do território. Em São Gonçalo, diversos locais sem infraestrutura, mesmo no plano, ganharam o nome de favela. Como é o caso de alguns bairros mais novos na cidade.

Entretanto, esse confronto de classes já não consegue se justificar. Até porque, independente de onde você more, é provável que ambos tenham que sair da cidade para trabalhar, uma vez que o dinheiro não está na região.

Por conta desse cenário, vemos o ‘fenômeno’ de pobre roubando pobre ou classe média baixa.

Esse meu questionamento frequente deu origem à primeira “Pesquisa Rápida” no SIM São Gonçalo. Um jeito de comparar a opinião das pessoas de diversos cantos da cidade. A primeira pergunta era “o que diferencia uma favela de um lugar não-favela em São Gonçalo?

O resultado não teve surpresas para quem conhece a região. Entretanto, mostrou que para muitos a questão de ser favela tem mais a ver com a presença do tráfico, do que com a presença de saneamento básico e calçamento.

Ainda temos muito o que evoluir, e o que melhorar. Ainda sim, fica a análise disponível para que a dita mídia hegemônica estude um pouco mais antes de chamar tudo de favela ou comunidade, uma vez que a situação é muito mais complexa que uma simples definição.

No final, somos todos cidades fluminense.

6 COMENTÁRIOS

  1. Favelas deveriam ser banidas de uma vez por todas do mapa. Nestes locais concentram-se tudo o que não é bom para a vida de ninguém. Falta tudo, como segurança, educação, saúde, infraestrutura, entre outras coisas e com isto, bandidos proliferam-se como ervas daninhas nestes lugares, dizimando famílias, atraindo menores para o tráfico, entre outras coisas. E muitas das vezes, são protegidos por moradores destas favelas.
    Deve-se urgentemente retirar as famílias de bem destas favelas, colocá-las em um lugar melhor, seguro e deixar somente o que não presta lá, para a PM fazer o seu trabalho sem colocar em risco a vida de pessoas de bem.

    • Oi, Fernando.

      Olha, se isso fosse fácil de ser feito, já teria sido realizado. Mas é fato que falta de tudo. Ultimamente, ando estudando a questão da urbanização das favelas.

      Só a implantação de saneamento básico e ruas calçadas conseguirá reduzir a incidência de algumas doenças que ainda permanecem nas regiões mais pobres de algumas favelas, como a tuberculose, e melhorar o acesso de serviços médicos, educacionais e de segurança nas regiões.

      Os bandidos pobres se escondem por lá para serem presas difíceis. Enquanto os bandidos ricos se escondem nos condomínios com segurança.

      Certamente, com um planejamento sério e uma oferta melhor de transporte, muita coisa seria resolvida. Falta mesmo é a gente parar de eleger gente inútil e incompetente. Infelizmente.

      Obrigado pelo comentário aqui no SIM!
      Abraços.

  2. Ótima matéria, Matheus. Acho um bom ponto de partida de discussão essa vista das cidades do cinturão da capital. Principalmente aquí, que é o segundo maior colégio eleitoral do Rio de Janeiro. Temos que mudar essa visão de simples comunidade tanto dentro como fora daqui. Mesmo não sendo cidade que mostre expressivo potencial financeiro, somos parte da mão que move outros municípios como Niterói e a própria capital e em vários setores. Administradores saem daqui pra mostrar potencial em outros municípios e estados (e em casos até países), temos artistas que saíram daqui e hoje despontam em artes cênicas, musical,produtora, literária. O problema do nosso município infelizmente é que muitos, as vezes, tem o complexo de inferioridade com o município e quando vai a outros lugares diz ser de Niterói por exemplo, por vergonha da cidade e ao invés de tentar melhorar junto com a beleza escondida de São Gonçalo(qual descobri que para encontrar até mesmo artefatos históricos da cidade e até mesmo do país, você é obrigado a garimpar nas pesquisas) a imagem da cidade, com a riqueza criativa de muitos, abstém-se até da sua naturalidade. Espero um dia podermos mudar essa situação junto com a cidade e mostrarmos que temos potencial pra ser muito mais que apenas a comunidade do lado de Niterói (que querendo ou não, vivemos a sombra de Niterói).

    • Agradecemos, Antônio.

      O que nos falta agora é organização municipal para conseguirmos atrair mais verbas e arrecadação para a cidade.

      Perdemos boas oportunidades nos últimos 3 governos, infelizmente. Mas só dessas ideias circularem na cidade, já é um indicativo de que estamos formando um novo movimento, com novas pessoas planejando o futuro da região.

      Obrigado pelo comentário. 🙂
      Abraços

  3. BOA NOITE , PRIMEIRO A CIDADE PRECISA DE UMA GRANDE OBRA DE INFRAESTRUTURA, GRANDES AVENIDAS, INFRAESTRUTURA , ISENÇAO DE IMPOSTOS PARA GRANDES EMPRESAS, INVESTIMENTO PESADO EM EDUCAÇAO, ,,,

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